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Oásis sustentável no Semiárido


Projeto Jovens Familiares Produzindo no Cariri auxilia no desenvolvimento sustentável do meio rural

Pela manhã, um clima agradável veio de surpresa. Na sabedoria sertaneja, quando o calor diminui, sempre há um pensamento de esperança de que uma chuvinha talvez venha regar as plantas e fazer subir da terra o mormaço que perfuma as floradas e habita com folhas verdes os galhos cansados da vegetação castigada pelo sol quente. Do meio da estrada de terra, seu Antonio, vinha com sua bicicleta, rumando tranquilo para sua residência, regressando de uma obrigação na rua. - Ei seu Antonio, esse menino quer falar com o senhor, sobre o PAIS, pode ser? - Anunciou Ery Cláudio, técnico do Projeto. - Pode. Vamo lá pra casa que eu falo e mostro. - dito e feito.

A casa de seu Antonio fica no sítio Tabuleiro, próximo de Nova Olinda. Sua propriedade abriga, além da casa da família e do filho mais velho, plantações diversas divididas entre dois pedaços de terra bem povoados de produções agroecológicas que seu Antonio melhorou graças a instalação do sistema de Produção Agroecológica Integrada e Sustentável (PAIS). “Depois que a gente encaixou esse projeto aqui, o projeto PAIS, aí a gente miorou, já dá pra fazer as produção direitin” disse seu Antônio, relatando sua experiência com o Projeto Jovens Familiares Produzindo no Cariri, patrocinado pela Petrobras, e realizado pela Associação Cristã de Base (ACB).

Em Junho deste ano foi instalado o sistema na propriedade de seu Antonio, que a partir daí pôde produzir coentro suficiente para o consumo de sua família escoando também para a venda, tanto na Feira Agroecológica de Nova Olinda, quanto no Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), no qual Antonio é contratado para suprir uma quantia de quase cinco mil reais anuais com produções de coentro e frango, também criados em sua propriedade. “A renda cresceu do projeto para cá, depois que a gente começou a trabalhar com a ACB deu uma renda boa, pra gente viver. Ave Maria! A renda dobrou!”, contou seu Antonio, animado com a prosperidade das produções da terra da família.

Além de produzir para o PAA, seu Antônio vende seu coentro para os arredores da propriedade da sua família, fazendo o nome do produto que é de fato muito saboroso. “Aqui vem gente de até uma légua dali pra cima pra comprar desse coentro aqui”, relata o agricultor. Com a chegada das cheias do ano que vem, seu Antônio espera ter água armazenada suficiente para expandir sua produção, aumentando a variedade de itens agrícolas para consumo e venda.

O ano da graça de 1997 marca a chegada de Seu Antônio a terra que hoje produz e floresce em meio ao sertão nordestino. “Quando cheguei aqui era só a varedinha, num tinha nada”, lembra. Agricultor desde que se entende por gente, Antonio viveu de rebolada até se estabelecer de vez no Sítio Tabuleiro, local onde formou sua família e onde vive a mais de 20 anos. “Quem não tem onde morar vive de rebolada né? Quem mora no que é dos outro pinga daqui e dali e num dá certo”.

Das suas vivências pelo mundo, o agricultor traz muita experiência de vida e trabalho no campo, inclusive saberes que hoje ele já não pratica mais. “Logo pra começa eu estraguei isso aqui, estraguei. Toquei fogo e acabei com tudo. Pense numa coisa errada que eu fiz rapaz. Foi a coisa mais errada que eu fiz na minha vida.”, revela seu Antonio, arrependido por ter visto o mal que o fogo faz a terra. O projeto conta com capacitações em agroecologia, que auxilia na adoção de práticas mais sustentáveis, que causam menor impacto à natureza.

A prosa corria mansa na aba da cisterna Chapéu de Pe. Cícero que usamos para escorar nossas costas por um tempinho. O clima agradável que reinava pelos primeiros pedaços da manhã contrastava com o período mais seco do ano no Semiárido, compreendido entre os meses de agosto e dezembro, quando a região ferve e o sol castiga os lombos que ficam debaixo da quentura. A estiagem sempre ronda o pensamento dos sertanejos e das sertanejas, e seu Antonio é treinado nas artes das secas.

“Em 99 eu peguei um empréstimo no banco e cavei uma cacimba ali com 55 palmo, agora isso com uma água boa que se visse sabe? Água de nascença”. Seu Antônio tirou por volta de 100 baldes de água da primeira cacimba que cavou em sua terra. A água, no entanto, era insuficiente para regar o plantio e servir de uso para o consumo. Com a instalação da cisterna, este problema foi aos poucos sendo resolvido.

A chápeu de Pe. Cícero tem capacidade para 52 mil litros de água. Este volume de água, além de garantir o consumo hídrico em tempos de estiagem, é suficiente para assegurar a melhora do espaço de cultivo a médio e longo prazo, além de ser uma alternativa de baixo impacto ambiental. O Cariri foi pioneiro na introdução deste tipo de cisterna no cotidiano dos trabalhadores e trabalhadoras rurais. Seu Antonio conta que o volume que a cisterna pegou em apenas uma cheia está sendo suficiente para irrigar suas zonas de cultivo e abastecer sua casa com água limpa e boa para consumo.

No meio da conversa, chamou a minha atenção um pé de planta que até então não conhecia. Uma árvore alta e verde, com a copa bem cuidada, como se passasse por uma poda recente. O tronco era firme e grosso, escondendo de olhos não treinados a idade que o tempo levou para deixa-la linda e forte como ali estava. “É um pé de Pereiro minino” me informou mestre Antonio. Um pequeno passeio pela propriedade me revelou um óasis frutífero no meio do sertão caririense: Caju, Acerola, Limão, Abacaxi e Banana, foram as árvores que consegui reconhecer. “Aqui tem, feijão que eu já tirei um baião desse pezim, tem fava ali na frente, tem o coentro e tem a cebolinha também ali ó” falou seu Antônio, engordando a lista de produções.

As plantações se mantêm fora do alcance das pragas pelo uso de pesticidas naturais que mestre Antonio utiliza para o controle das pragas de suas leiras. Ele dá a receita: “Bota o nim de molho com um pouco de sabão omo ou detergente, pra afastar a praga só afastar sem matar.” O Nim é uma árvore de origem indiana, muito resistente ao clima árido, servindo como repelente natural para um grande número de insetos.

Apesar do trabalho custoso que a terra necessita para dar seus frutos, seu Antônio não abre mão de que a sua produção seja totalmente agroecológica. Da adubação com serragem de madeira ao controle natural de pragas, passando pelo cultivo consciente, seu Antonio se mantém no caminho da agroecologia por uma questão de livre escolha.

“Já quiseram botar preço aqui na terra, mas eu não aceito. Isso aqui é pra família morar e eu viver até depois de véi”, declara mestre Antônio que não pretende sair do seu torrão, agora mais irrigado e frutífero do que nunca. Na labuta diária, a vida se mistura com a terra, garantindo a Antônio e sua família a prosperidade simples, sem luxos. Apenas trabalho familiar e satisfação. Somente.

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